Me impulsionam pelas matas densas pés descalços de curta vida. Pouco mais de trinta anos me embrulham frouxos o corpo sedento. Sobre os dedos calosos, cortados, equilibra-se em patético malabarismo o expressivo peso da minha vontade - cambaleando, sigo. No início do caminho estreito, uma encruzilhada e um hoje-branco, estatelado em oferenda. Então, me deixo arrebatar pelo perfeito momento-presente eternizado em nesga de sol e aqueço. Esqueço os medos e esvazio dos meus tantos vãos. Sou agora só desejo escancarando os poros e esfregando pelo corpo inteiriço a felicidade suprema de estar exatamente naquele lugar. E estar quem estou. Da grama úmida, a certeza do incerto borbulha, amortecendo os passos. Sorrio. Inexisto na lembrança de uma veracidade inventada e desconstruo. Um suspiro rodopia altivo nas entranhas do nariz e me assopra curto recado do rio: siga. Frágil, pressinto aturdida o arrebatamento das águas negras- revoltas, mas os planos já estão desfeitos. Não há meias-voltas - me resta ir além. O rio que lateja em mim murmura: é pouco ainda, eu estou em toda parte. E quando irrompe inteiro nas veias, arrastando em enfurecida pororoca minhas tantas exatas exatidões, me faz rio. Inundada, so(u)rrio em incurável e irreversível deságue.
Sylvia Araujo
4 comentários:
Por mais longe que vá, a vida parecerá curta demais. Gostaria de habitar mais alguns planetas para semear todos os sentimentos que este mundo não deu conta e feito você inundada não curar esse deságue.
irresistível enxurrada!
bjs
Já faz um tempo que não apareço por aqui, mas como sempre "molho-me feliz com seu transbordante talento".
Bjos!
Perfeito "corpo hidrico"!:)
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